Jurisprudências – Direito Digital

Coletânea de jurisprudências relacionadas a Direito Digital e Crimes Cibernéticos

RESPONSABILIDADE CIVIL. INTERNET. REDES SOCIAIS. MENSAGEM OFENSIVA. CIÊNCIA PELO PROVEDOR. REMOÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.323.754 – RJ (2012/0005748-4) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE : GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA ADVOGADO : ESTER PEREIRA RANGEL DEL RIO E OUTRO(S) RECORRIDO : GRASIELE SALME LEAL ADVOGADO : GISELE SALME LEAL E OUTRO(S) EMENTA RESPONSABILIDADE CIVIL. INTERNET. REDES SOCIAIS. MENSAGEM OFENSIVA. CIÊNCIA PELO PROVEDOR. REMOÇÃO. PRAZO. 1. A velocidade com que as informações circulam no meio virtual torna indispensável que medidas tendentes a coibir a divulgação de conteúdos depreciativos e aviltantes sejam adotadas célere e enfaticamente, de sorte a potencialmente reduzir a disseminação do insulto, minimizando os nefastos efeitos inerentes a dados dessa natureza. 2. Uma vez notificado de que determinado texto ou imagem possui conteúdo ilícito, o provedor deve retirar o material do ar no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de responder solidariamente com o autor direto do dano, em virtude da omissão praticada. 3. Nesse prazo de 24 horas, não está o provedor obrigado a analisar o teor da denúncia recebida, devendo apenas promover a suspensão preventiva das respectivas páginas, até que tenha tempo hábil para apreciar a veracidade das alegações, de modo a que, confirmando-as, exclua definitivamente o perfil ou, tendo-as por infundadas, restabeleça o seu livre acesso. 4. O diferimento da análise do teor das denúncias não significa que o provedor poderá postergá-la por tempo indeterminado, deixando sem satisfação o usuário cujo perfil venha a ser provisoriamente suspenso. Cabe ao provedor, o mais breve possível, dar uma solução final para o conflito, confirmando a remoção definitiva da página de conteúdo ofensivo ou, ausente indício de ilegalidade, recolocando-a no ar, adotando, nessa última hipótese, as providências legais cabíveis contra os que abusarem da prerrogativa de denunciar. (grifo nosso) 5. Recurso especial a que se nega provimento.

Sendo assim, o conteúdo denunciado será avaliado, primeiramente, pelo servidor de conteúdo que disponibiliza o serviço e não pelo Judiciário. Podemos concluir que tanto no número de direitos protegidos por denúncias devidas, também, poderão haver tantas quantas denúncias falsas, já que pela celeridade na retirada, por muitas vezes será compensadora ao denunciante.

Esta possibilidade foi prevista pela própria Ministra relatora, tanto assim o é que a mesma declarou: “Embora esse procedimento possa eventualmente violar direitos daqueles usuários cujas páginas venham a ser indevidamente suprimidas, ainda que em caráter temporário, essa violação deve ser confrontada com os danos advindos da divulgação de informações injuriosas, sendo certo que, sopesados os prejuízos envolvidos, o fiel da balança pende indiscutivelmente para o lado da proteção da dignidade e da honra dos que navegam na rede”

E mais: “Se, por um lado, há notória impossibilidade prática de controle, pelo provedor de conteúdo, de toda a informação que transita em seu site; por outro lado, deve ele, ciente da existência de publicação de texto ilícito, removê-lo sem delongas” (REsp 1.186.616).

Ou seja, além de ser célere, o controle deverá ser efetivo. A pergunta que fica é: e se o conteúdo for falsamente denúnciado e a retirada, mesmo que por poucos dias, do ar já consubstanciaria em grande prejuízo ao titular daquele conteúdo em redes sociais? Há de ser lembrado que grandes empresas usam o espaço nas redes sociais como ferramenta de marketing, o chamado de social marketing, investem enormes quantidades de dinheiro para estarem presentes e terem o alcance no seu público, chamado, também, de target.

Sendo assim, na véspera do lançamento de um novo produto, poderão haver denúncias falsas de concorrentes para que o evento seja menosprezado pelos consumidores ou que o mesmo passe despercebido do grande público.

Outro exemplo que pode ser tão nocivo quanto o acima citado, principalmente, já que estamos em ano eleitoral no país é o estipulado na Resolução n. 23.370/2011 do Tribunal Superior Eleitoral, que regerá as eleições do ano 2012 no Brasil. Lá está previsto no artigo 23 que: Art. 23. Aplicam-se ao provedor de conteúdo e de serviços multimídia que hospeda a divulgação da propaganda eleitoral de candidato, de partido ou de coligação as penalidades previstas nesta resolução, se, no prazo determinado pela Justiça Eleitoral, contado a partir da notificação de decisão sobre a existência de propaganda irregular, não tomar providências para a cessação dessa divulgação (Lei no 9.504/97, art. 57-F, caput). § 1o O provedor de conteúdo ou de serviços multimídia só será considerado responsável pela divulgação da propaganda se a publicação do material for comprovadamente de seu prévio conhecimento (Lei no 9.504/97, art. 57-F, parágrafo único). § 2o O prévio conhecimento de que trata o parágrafo anterior poderá, sem prejuízo dos demais meios de prova, ser demonstrado por meio de cópia de notificação, diretamente encaminhada e entregue pelo interessado ao provedor de internet, na qual deverá constar, de forma clara e detalhada, a propaganda por ele considerada irregular.

Em resumo, o conteúdo previamente notificado por outrem ao servidor de conteúdo passará a ser responsabilidade do servidor, podendo este ser punido igualmente à pena que o indivíduo que lá postou o conteúdo indevido receberia. Tendo em vista que o processo eleitoral é um processo intenso e de curta duração somado com este “poder” do servidor em avaliar o conteúdo indevido – decidindo ou não – e de retirá-lo ao seu próprio juízo, poderá ser também danoso ao prejudicado por uma denúncia falsa. Por exemplo: um blog mantido pelo candidato X, extremamente ligado aos meios de internet de comunicação, jovem ativista e que pelo perfil de sua candidatura, seu eleitorado jovem e o baixo orçamento, veicula vários conteúdos eleitorais legalmente durante toda a campanha. Contudo no momento mais importante – 48hs anteriores ao pleito – e de cunho mais incisivo da estratégia da campanha eleitoral é denunciado pelo seu concorrente, pois lá estão diversos escândalos ligados a ele e tal fato pode mudar os rumos da eleição. Tendo em vista que o conteúdo é incisivo e pela ameaça da própria Resolução do TSE em responsabilizar o servidor de conteúdo, este o retira, fazendo com que os eleitores – ou o eleitor no qual o candidato estava focado em conquistar o seu voto – não tenha acesso ao conteúdo.

Em ambos os casos estamos falando de situações muito importantes as quais uma decisão errônea do servidor de conteúdo notificado poderão trazer grandes prejuízos e, ainda, darão à uma empresa particular a prerrogativa de julgar o que seria um direito lesado ou ameaçado, em lugar do Poder Judiciário. Poderemos estar dando ao Google (por exemplo) o poder de um Juiz… data vênia!